Pensadores Vivos da Alma: Psicanalistas, Psicólogos e Psiquiatras que Ainda Pensam o Humano

Pensadores Vivos da Alma: Psicanalistas, Psicólogos e Psiquiatras que Ainda Pensam o Humano
Pensadores Vivos da Alma: Psicanalistas, Psicólogos e Psiquiatras que Ainda Pensam o Humano

Existe uma fantasia perigosa circulando por aí: a de que a Psicanálise morreu, foi superada ou dissolvida em técnicas rápidas e protocolos de cinco sessões. Basta sentar diante de um sujeito em sofrimento real para essa ilusão cair por terra. O inconsciente segue operando, o conflito insiste, o desejo tropeça, e a angústia continua falando quando ninguém quer ouvir. O que mudou não foi o humano, foi a forma de escutá-lo. E alguns pensadores contemporâneos seguem fazendo isso com coragem, rigor e profundidade.

No campo da psicanálise moderna, Mark Solms ocupa um lugar central. Ele recoloca Freud no século XXI ao mostrar que o afeto é o motor da mente. Antes de pensar, o cérebro sente. A consciência nasce do corpo, não o contrário. Solms não abandona a psicanálise para dialogar com a neurociência. Ele faz o movimento inverso, leva a neurociência de volta ao inconsciente. Na clínica, isso muda tudo, especialmente no trabalho com trauma, depressão e estados de desamparo.

André Green, mesmo após sua morte, segue sendo um autor radicalmente atual. Seu conceito de trabalho do negativo ajuda a entender pacientes que não sofrem por excesso de conflito, mas por vazio, apagamento e ausência de simbolização. São sujeitos que não conseguem desejar porque algo morreu cedo demais dentro deles. Quem atende estados-limite sabe exatamente do que ele está falando.

Thomas Ogden traz a clínica para o centro da experiência. Ele lembra que o analista não é um técnico neutro, mas alguém implicado no campo. O chamado terceiro analítico mostra que algo novo nasce na relação, algo que não pertence nem ao paciente nem ao analista isoladamente. É psicanálise viva, sem dogma.

Jean Laplanche devolve à psicanálise um ponto que muitos tentaram domesticar: o enigma do outro. A sexualidade, para ele, não nasce de dentro, mas da invasão do outro, do excesso de sentido que a criança não consegue traduzir. É desconfortável, mas profundamente verdadeiro.

Christopher Bollas, por sua vez, fala da singularidade. Cada sujeito carrega um idioma próprio, um modo único de existir. Sua noção de objeto transformacional ilumina a clínica de quem busca, mais do que interpretar, permitir que algo se transforme.

No campo da psicologia, Daniel Kahneman desmonta a ilusão do sujeito racional. Mostra empiricamente que somos governados por processos automáticos, rápidos e inconscientes. Freud sorri no túmulo. Paul Ekman oferece um mapa preciso das emoções humanas, essencial para compreender repressão, acting out e comunicação não verbal na clínica. Albert Bandura ajuda a pensar o quanto o sujeito se constrói no laço social, enquanto Carol Dweck mostra como crenças inconscientes moldam destinos psíquicos. Jonathan Haidt escancara o papel das emoções morais, lembrando que pensamos menos do que sentimos, inclusive quando defendemos nossas verdades.

Entre os psiquiatras psicanalistas, Antonio Damasio talvez seja o mais contundente. Ele mostra que razão sem emoção não existe. O corpo pensa. O afeto organiza a mente. Allan Schore aprofunda o entendimento do trauma precoce e da regulação emocional, oferecendo base neurobiológica para aquilo que a clínica sempre soube. Peter Fonagy, com o conceito de mentalização, mostra que muitos sofrimentos nascem da incapacidade de pensar os próprios estados mentais e os do outro. Vittorio Gallese, ao estudar os neurônios-espelho, oferece um suporte neurocientífico para empatia, intersubjetividade e transferência.

Esses autores não prometem cura rápida. Não vendem atalhos. Eles sustentam algo cada vez mais raro: a complexidade do humano. Ler esses pensadores é um antídoto contra a pressa, contra o empobrecimento da clínica e contra a ilusão de que sofrimento se resolve com frases prontas. A psicanálise segue viva porque o inconsciente não pede licença para existir.

Referências Bibliográficas

Freud, S. Obras Completas. Imago.
Solms, M. The Hidden Spring. W. W. Norton & Company.
Green, A. O Trabalho do Negativo. Imago.
Ogden, T. The Analytic Third. Routledge.
Laplanche, J. Novos Fundamentos para a Psicanálise. Martins Fontes.
Bollas, C. The Shadow of the Object. Columbia University Press.
Damasio, A. O Erro de Descartes. Companhia das Letras.
Schore, A. Affect Regulation and the Origin of the Self. Routledge.
Fonagy, P. Affect Regulation, Mentalization and the Development of the Self. Karnac.
Kahneman, D. Rápido e Devagar. Objetiva.
Ekman, P. Emotions Revealed. Times Books.

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