Ele introduz a ideia revolucionária de que o inconsciente é a instância suprema do saber - uma espécie de deus na psicanálise. “Deus é inconsciente”, afirma Lacan, não no sentido religioso tradicional, mas na medida em que o inconsciente comanda a estrutura do sujeito, orienta o desejo e escapa ao controle consciente. O inconsciente não é ignorância, é um saber oculto e pulsante.
O gozo, para Lacan, não é apenas prazer. É uma força paradoxal que pode ser também sofrimento, excessos, sofrimento que atravessa o corpo e a psique. O gozo feminino, em especial, representa um excesso que não se regula pela lei do falo, que não se simboliza integralmente e, portanto, inaugura um campo novo para pensar a subjetividade.
Lacan explora como esse gozo se manifesta no sintoma, na pulsão, na repetição. Ele insiste que a análise não visa a eliminar o gozo, mas a desamarrá-lo dos formatos neuróticos que o aprisionam. Liberar o sujeito para que ele crie seus próprios modos de gozar, suas próprias respostas ao real.
Neste seminário, a linguagem volta a ser o campo de batalha e de criação. Lacan insiste que o inconsciente é estruturado como linguagem, mas que o real invade essa estrutura com sua falha, seu furo, sua impossibilidade de ser completamente simbolizado. É nessa tensão que o sujeito se move.
Mais ainda, Lacan apresenta o que chamou de “mais-de-gozar”, uma pulsão que não se satisfaz, que nunca é saciada. É o motor do desejo, mas também da angústia. O mais-de-gozar é o que impele o sujeito a continuar a busca, a análise, a criação, mesmo diante do impossível.
A ética da psicanálise, aqui, se desenha como um compromisso com esse real do gozo. Um convite a não fugir da verdade do desejo, por mais perturbadora que seja. A análise é um convite a atravessar os fantasmas, a confrontar a falta, a habitar o impossível com coragem.
Lacan conclui mostrando que a psicanálise é uma aventura no limite do sentido, uma travessia onde o sujeito pode se inventar. Deus é inconsciente não como uma certeza metafísica, mas como a evocação do saber que nos atravessa e que nunca cessamos de buscar.
No Seminário XX, Mais, Ainda. O gozo feminino é desmedido. Não-todo. Não se inscreve no fálico. A mulher não existe como universal. O gozo feminino é Outro. Não é falta. É excesso. E isso escapa à lógica fálica. A sexualidade é equívoca. O corpo é letra.
Referências confiáveis
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Lacan, Jacques. Le Séminaire, Livre XX: Encore (1972–1973), ed. Seuil
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Miller, Jacques-Alain. O gozo feminino e o inconsciente, seminários comentados.
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Zizek, Slavoj. O sujeito incômodo e Como Ler Lacan, sobre o seminário Encore.
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Soler, Colette. A ética da psicanálise.
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Roudinesco, Élisabeth. Lacan: uma biografia intelectual.
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