Pular para o conteúdo principal

POSTAGENS

A Teoria do Inconsciente em Psicanálise

A Teoria do Inconsciente em Psicanálise Etimologicamente, a palavra “inconsciente” vem do latim in- (não) + conscientia (conhecimento). Literalmente, algo que não é conhecido. Desde sua origem, ela carrega a tensão entre o saber e o oculto. Essa tensão ilumina o núcleo da psicanálise que é a existência de processos psíquicos que moldam nosso pensar, sentir e agir sem que tenhamos acesso direto. Na psicanálise de Freud, o inconsciente emerge como descoberta revolucionária, fundamental para entender a subjetividade. Freud observou, em pacientes histéricas e em fenômenos como atos falhos, sonhos, sintomas, que existiam conteúdos psíquicos ativos, recalcados, que exerciam pressão contínua sobre a consciência ( Ipa World ). Quando, na obra “O Inconsciente” (1915), ele defendeu que sem esse conceito seria impossível explicar vários fenômenos mentais, ele estava estabelecendo a metapsicologia do aparelho psíquico ( Ipa World ). A topografia freudiana divide a mente em inconsciente, pré‑...

Jacques Lacan – Um diálogo para todos no ritmo da alma que deseja saber


TELEVISÃO

Jacques Lacan – Um diálogo para todos, no ritmo da alma que deseja saber

A cena se abre. Um homem fala. Outro responde. Mas não há simetria. O “Entrevistador” representa o público, a dúvida, o mundo moderno que busca compreender mas Lacan não facilita. Ele responde sem explicar. Corta, torce, elide. Está em cena, mas não para agradar. Está para provocar.

“Por que ainda há psicanálise?” pergunta-se logo no início. Lacan responde sem piedade: porque o mal-estar persiste. Porque o sujeito ainda sofre. Sofre de ser falado pelo desejo do Outro, sofre por ter um corpo que goza sem permissão. E é disso que a psicanálise trata: daquilo que escapa ao sentido, do gozo que não se traduz, do furo que nenhuma ciência fecha.

Aqui, Lacan já não se esforça para ser pedagógico. Ele assume a linguagem de sua época complexa, cortante, impregnada de lógica e topologia. Mas ao mesmo tempo, em Televisão, ele se despoja do tom catedrático e mostra a pulsação daquilo que o move. “O inconsciente é estruturado como uma linguagem”, diz ele de novo, mas agora aponta: é uma linguagem falada por um Outro que não se sabe. Um discurso sem sujeito. E é nesse discurso que o sujeito aparece não como presença, mas como falta.

Ele fala do analista, esse estranho que se cala para deixar o Outro falar. Que se ausenta para que o sujeito se encontre. Mas que também, no ato de escuta, coloca-se como objeto objeto a. O analista não interpreta no estilo tradicional. Ele corta, pontua, marca o Real. Ele cria a condição de emergência do sujeito.

Lacan reafirma que o inconsciente não é o lugar de verdades recalcadas apenas é o campo da verdade que se diz meio por acaso. Um saber que não se sabe, que surge no tropeço, no lapso, no sonho. E a análise é a travessia desse saber em direção ao impossível o impossível de dizer o real do gozo.

Falando à televisão, Lacan denuncia o discurso da Universidade um dos quatro discursos que ele formalizou. Esse discurso busca o saber, mas em nome do mestre. Produz objetos, doutrina, saber-poder. A psicanálise, em contraste, é o discurso do analista: aquele que se sustenta na falta, que subverte a ordem do saber estabelecido.

No centro de tudo está o gozo jouissance. Lacan o apresenta como o ponto opaco, o que a linguagem não domestica. O gozo é o que ultrapassa o prazer, o que transborda, o que faz sofrer. E é aí que o sujeito se encontra: nesse limite entre o que goza e o que pode ser dito.

No final, Lacan joga a bomba: “A psicanálise é irreversível.” Uma vez que o sujeito reconhece o inconsciente, não há retorno. O saber do desejo transforma. Não se trata de cura, mas de travessia. O analista não é um educador. Ele é um deseducador do eu. E a televisão, aqui, é apenas um espelho um novo tipo de espelho onde a imagem retorna com excesso.

A entrevista termina, mas não se encerra. Fica aberta como o próprio inconsciente: cheia de desvios, cortes, entrelinhas. Lacan não quer ser entendido. Ele quer ser lido, escutado, atravessado.

Referências bibliográficas confiáveis

  1. LACAN, Jacques.
    Televisão: Uma Nova Comunicação. Trad. Cláudia Berliner. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993.
     - Obra original em forma de entrevista escrita, dirigida ao grande público com supervisão técnica.

  2. MILLER, Jacques-Alain.
    Lecciones sobre Televisión. Buenos Aires: Paidós, 2000.
     - Comentários detalhados sobre os principais conceitos abordados por Lacan.

  3. FINK, Bruce.
    The Lacanian Subject. Princeton: Princeton University Press, 1995.
     - Capítulos que decifram o discurso do analista, o objeto a, e a estrutura do gozo.

  4. ŽIŽEK, Slavoj.
    Looking Awry: An Introduction to Jacques Lacan through Popular Culture. MIT Press, 1992.
     - Reflexões que ligam Lacan à mídia e à cultura televisiva.

  5. NASIO, Juan-David.
    Cinco lições sobre a Teoria de Jacques Lacan. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992.
     - Apresenta a lógica do discurso lacaniano de forma introdutória e clara.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Jacques Lacan - Seminário X: A Angústia (1962-1963)

Jacques Lacan - Seminário X: A Angústia (1962-1963) Neste seminário decisivo, Lacan nos convida a olhar de frente aquilo que o sujeito evita: a angústia. Diferente do medo, que tem objeto claro e ameaça externa, a angústia brota do íntimo, do ponto em que o desejo do Outro nos atravessa. Freud dizia que a angústia é sem objeto. Lacan o contradiz: a angústia tem objeto, sim, mas é um objeto estranho, deslocado, um objeto que não é do mundo exterior, e sim um pedaço perdido do sujeito. Este objeto é o famoso objeto a. A angústia se instala quando esse objeto aparece mais do que deveria. Não é sua ausência que angustia, mas sua presença excessiva, invasiva, desmedida. Lacan nos ensina que a angústia é o afeto que não engana. Enquanto os outros afetos podem se disfarçar, podem ser projetados, deslocados, a angústia é pura, direta, sinal do real que se impõe. O sujeito, para Lacan, é um efeito do significante. Ele nasce pela perda, pela entrada na linguagem. Ao ser nomeado, algo de si é a...

Série "8 em Istambul": Um Espelho da Alma Contemporânea

Série "8 em Istambul": Um Espelho da Alma Contemporânea Queridos leitores, hoje lhes trago não apenas a indicação de uma série, mas a partilha de uma travessia. “8 em Istambul” (título original  Bir Başkadır ) não é apenas um produto audiovisual da  Netflix , mas uma pulsação psíquica em forma de drama. Criada e dirigida por  Berkun Oya , estreou em  2020  e traz em seus  8 episódios  uma meditação profunda sobre o inconsciente coletivo de uma sociedade cindida entre tradição e modernidade. É turca em sua forma e humana em seu conteúdo. É Istambul, mas é também São Paulo, Cairo, ou qualquer outra metrópole onde o sagrado e o profano, o patriarcal e o libertário, a palavra e o silêncio, ainda duelam dentro de nós. Sobre o elenco A série conta com atuações profundamente expressivas e humanamente verossímeis.  Öykü Karayel  interpreta  Meryem , uma jovem faxineira que começa a desmaiar sem razão aparente. Seu irmão autoritário,  Yas...

A Interpretação dos Sonhos: quando o inconsciente revela sua poesia noturna

A Interpretação dos Sonhos : quando o inconsciente revela sua poesia noturna Por Ruy de Oliveira Adormecemos e, ao fechar os olhos, iniciamos uma travessia silenciosa. Os sonhos surgem como mapas cifrados, carregando em suas imagens a essência do que fomos, do que desejamos, do que tememos. Em " A Interpretação dos Sonhos ", Freud revela que os sonhos não são meras fantasias do sono, mas manifestações autênticas da alma inconsciente. São obras simbólicas, expressões de desejos recalcados que encontram no palco noturno um modo disfarçado de se dizerem. Este livro , publicado em 1900, não apenas inaugura a psicanálise como método terapêutico, mas também como uma visão revolucionária da mente humana. Nele, Freud constrói um sistema onde o sonho ocupa o lugar de estrada privilegiada que conduz ao inconsciente. Como afirma o autor, o sonho é uma realização disfarçada de um desejo reprimido. Cada imagem onírica, por mais absurda que pareça, esconde em seu núcleo um conteúdo ps...